24 março 2014

Tarde cinzenta…em Santarém



Texto e foto: Ludgero Mendes


Santarém, 22 de Março de 2014 – 16 Horas; Corrida à Portuguesa; Cavaleiros – Rui Salvador, Luís Rouxinol, Duarte Pinto e Mara Pimenta (Amadora); Grupos de Forcados Amadores de Santarém e de Montemor; 6 toiros de Prudêncio e 1 novilho-toiro de Passanha; Director de Corrida – Lourenço Luzio; Veterinário – Dr. João Nobre.

Santarém viveu no passado sábado, com pouco entusiasmo, a abertura da temporada escalabitana durante a qual se assinalam as Bodas de Ouro da sua Praça de Toiros Monumental “Celestino Graça”, registando-se uma escassa presença de público – talvez menos de ¼ da lotação da praça – e apreciando-se um espectáculo parco de motivos de interesse, para o que também contribuiu o frio e a reduzida bravura dos hastados. Enfim, muita contrariedade para uma corrida só!

O cartel até estava bem composto, reunindo três cavaleiros com provas dadas, uma jovem cavaleira amadora precedida de boas referências, e dois dos mais valorosos grupos de forcados em acesa, e antiga, competição. Os toiros, anunciados como terroríficos, de facto, não fizeram jus ao nome, tinham idade, estavam medianamente apresentados e, em alguns casos, até evidenciavam condições de lide, mas não lograram estimular os marialvas para melhor e mais profundo labor.
Lourenço Luzio, assessorado tecnicamente pelo médico-veterinário Dr. João Nobre, dirigiu com acerto e elevada ponderação, quase não se fazendo notar, o que, à imagem do que ocorre com os árbitros de futebol, é muito bom sintoma.
Rui Salvador comemora na presente temporada o trigésimo aniversário sobre a data da sua alternativa, sendo, por isso, um toureiro experiente e sabedor, atributos a que devemos juntar a honradez e a valentia de que sempre dá mostras, porém, dadas as características do seu toureio, carece de toiros que o incomodem, que apertem na reunião, e, então, rubrica os poderosos “ferros impossíveis”, de um risco e de uma verdade insuperáveis. Pois, disso não teve em Santarém, uma vez que mais parecia que os seus oponentes ali andavam apenas para cumprir calendário, sem se aplicarem na medida do desejável, especialmente o segundo, que, de tão andarilho, nem consentia a definição das sortes como mandam as regras. Rui Salvador andou diligente, sóbrio, voluntarioso, bregando com acerto, no equilíbrio entre as melhores distâncias e o mais recomendado andamento, mas as sortes saíram, em regra, insonsas, sem o aperto usual e, por isso, sem galvanizarem o público que se habituou a vibrar com o seu desempenho.
Luís Rouxinol é, por estilo próprio, um toureiro que empatiza facilmente com o público pelo dinamismo que empresta à sua função, alardeando imensas faculdades técnicas e artísticas, pelo que se impôs como um cavaleiro de grande categoria. Nesta passagem por uma praça que já lhe apreciou tantos triunfos, Rouxinol limitou-se a cumprir com dignidade, mas sem lograr atingir o plano dessas tardes memoráveis. 
Andou com sobriedade, tentando, e conseguindo, lidar como mandam as regras, contudo, sem a alegria e vivacidade das jornadas gloriosas que já lhe presenciámos. 
Cravou certeiramente a ferragem, em algumas sortes com menor colaboração das montadas, e chegou mais ao respeitável com a colocação do “palmito” e do, indispensável, par de bandarilhas, que resultou bem.
Duarte Pinto é uma presença habitual em Santarém nas últimas temporadas, pelo que os aficionados escalabitanos têm acompanhado a sua progressão técnica e artística, que tem sido considerável. Não abdicando de um estilo ortodoxo, respeitador da tradição marialva, Duarte Pinto privilegia as sortes frontais, de poder a poder, e reúne em terrenos de muito risco, exigindo, para tal, toiros que não se distraiam e que invistam de largo, o que não aconteceu no passado sábado. Para mais, o cavaleiro de Paço d’Arcos, no afã de afirmar a sua honradez, concedeu a distância de todo o diâmetro da arena nos cites, pelo que o toiro saía de sorte amiúde, enfastiando o público pela insistência numa sorte a que o toiro não se ajustava. Ser fiel a um estilo de toureio não obriga que se façam as coisas sempre da mesma maneira, na medida em que o toureio tem sempre de se adequar às características do toiro, e estes toiros de Prudêncio, de facto, não se prestavam a essa função. Apesar de tudo, registaram-se detalhes bem meritórios nas lides de Duarte Pinto.
A jovem cavaleira Mara Pimenta não defraudou as expectativas, desenvolvendo uma lide agradável, dinâmica, mas sem precipitações nem correrias, e evidenciou convicção e pontaria na colocação da ferragem da ordem. Bem montada, o que é uma grande ajuda, Mara foi uma lufada de juventude e de encanto nesta tarde algo sensaborona e entediante. Justificou a aposta e, naturalmente, deixou ambiente, esperando-se que possa evoluir nesta mesma linha, embora sem deslumbramentos, porque há muito trabalho pela frente.
Se os toiros de Prudêncio não saíram fáceis para o toureio a cavalo, para as pegas também não foram nada cómodos, até que porque o “peso da idade”, indiciador de apurado sentido e de rápida aprendizagem, também ditou as suas regras. De tal modo que apenas dois toiros foram pegados à primeira tentativa, embora ambos os Grupos tenham levado a carta a Garcia, honrando os seus pergaminhos.
Pelos Amadores de Santarém, compostos por muita gente jovem, foram solistas João Vaz Freire, que consumou pega fácil ao primeiro intento, António Taurino, à terceira, fechando-se com determinação e bem ajudado, Ruben Giovety, à terceira, aguentando violentos derrotes, e, a pegar o novilho de Passanha, António Goes, que consumou pega fácil ao segundo intento.
Pelos Amadores de Montemor foram solistas António Vacas de Carvalho, Cabo do Grupo, que consumou a sua sorte apenas ao quarto intento, com ajudas carregadas, Manuel Dentinho, que se fechou eficazmente ao primeiro intento, e João Romão que realizou boa pega, à segunda tentativa.
Assim foi esta corrida inaugural de uma temporada que se deseja festiva e importante, mau grado que os prenúncios não tenham sido de grande augúrio.